‘Manifesto Eleitoral do Povo’ por Pierre-Joseph Proudhon

Nossos princípios!

Sempre os homens que recorreram ao sufrágio popular para chegar ao poder enganaram as massas pelas pretensas declarações de princípios que, no fundo, não foram nada mais que declarações de promessas!

Sempre os ambiciosos e os intrigantes prometeram ao povo, em frases mais ou menos sonoras:
A Liberdade, a igualdade, a fraternidade;
O trabalho, a família, a propriedade, o progresso;
O crédito, a instrução, a associação, a ordem e a paz;
A participação no governo, a distribuição equitativa do imposto, a administração honesta e barata, a justiça justa, a igualdade progressiva das fortunas, a libertação do proletariado, a extinção da miséria!

Prometeram tanto que, após eles, é preciso confessá-lo, não resta nada a prometer.

Mas também, o que eles cumpriram? É ao povo que cabe responder: nada!

Os verdadeiros amigos do povo devem mudar de comportamento de hoje em diante. O que o povo espera de seus candidatos, o que lhes exige, não são mais promessas, são os meios.

É sobre os meios que propõem que é preciso julgar os homens; é assim que exigimos que se nos julguem.

Democtratas-socialistas, não somos, para dizer a verdade, de nenhuma seita, de nenhuma escola. Ou melhor, se fosse preciso classificar-nos a nós mesmos, diríamos que somos da escola crítica. O socialismo não é de modo algum para nós um sistema; é simplesmente um protesto. Entretanto, acreditamos que nos trabalhos socialistas destaca-se um conjunto de princípios e de ideias opostos à rotina econômica e que foram aceitos na fé popular; e é por isso que nós nos dizemos socialistas. Fazer profissão de socialismo e nada aceitar do socialismo, como o fazer os mais espertos, seria zombar do povo e abusar de sua credulidade.

Não é tudo ser republicano; não é tudo reconhecer que a República deve se cercar de instituições sociais; não é tudo escrever sobre sua bandeira: República democrática e social; é preciso marcar claramente a diferença da antiga sociedade com a nova; é preciso dizer o que produziu de positivo o socialismo; em que e por que a Revolução de Fevereiro, que é sua expressão, é uma revolução social.

Estabeleçamos antes o dogma fundamental, o dogma puro do socialismo.

O Socialismo tem por objetivo a libertação do proletariado e a extinção da miséria, quer dizer, a igualdade efetiva das condições entre os homens. Sem igualdade sempre haverá miséria, sempre haverá ploretariado.

O socialismo, igualitário antes de tudo, é então a fórmula democrática por excelência. Se políticos menos sinceros experimentarem alguma repugnância em confessá-lo, respeitamos sua reserva; mas, é preciso que eles o saibam, a nossos olhos não são absolutamente democratas.

Oras, qual é a causa da desigualdade?

Esta causa, segundo nós, foi tornada pública por todas as críticas socialistas que se sucederam, notadamente depois de Jean-Jacques (Rousseau); esta causa é a realização na sociedade desta tripla abstração: capital, trabalho, talento.

É porque a sociedade se dividiu em três categorias de cidadãos correspondentes aos três termos desta fórmula; quer dizer, porque se fez nela uma classe de capitalistas ou proprietários, uma outra classe de trabalhadores e uma terceira classe de capacidades, é que constantemente se chegou nela à distinção de castas e que a metade do gênero humano foi escrava da outra metade.

Por toda a parte em que se pretendeu de fato, organicamente, estas três coisas, o capital, o trabalho e o talento, o trabalhador foi escravizado: ele se chamou alternativamente escravo, servo, pária, plebeu, proletário; o capitalista foi explorador: nomeia-se ora patrício ou nobre, ora proprietário ou burguês; o homem de talento foi um parasita, um agente de corrupção e servidão: este foi primeiro o sacerdote, mais tarde o clérigo, hoje o funcionário público, qualquer gênero de capacidade e de monopólio.

O dogma fundamental do socialista consiste então em transformar a fórmula aristocrática: capital-trabalho-talento nesta simples: trabalho! – em fazer, por conseguinte, que todo cidadão seja ao mesmo tempo, com idêntico valor e num mesmo grau, capitalista, trabalhador e sábio ou artista.

O produtor e o consumidor, na realidade das coisas, como na ciência econômica, é sempre o mesmo personagem, considerando somente de dois pontos de vista diferentes. Por que este não seria da mesma maneira capitalista e trabalhador? Trabalhador e artista? Separai estas qualidades na organização social e vós criais fatalmente castas, a desigualdade, a miséria; uni-as, ao contrário, em cada individuo, e vós tendes a igualdade, tendes a República. É assim ainda que na ordem política devem se apagar um dia todas estas distinções de governantes e governados, administradores e administrados, funcionários públicos e contribuintes, etc. É necessário, para o desenvolvimento da ideia social, que cada cidadão seja tudo; porque, se não é tudo, ele não é livre; sofre opressão e exploração em algum aspecto.

Qual é então o meio de operar esta grande fusão?

O meio é indicado pelo próprio mal. E, em primeiro lugar, esforcemo-nos para ainda melhor definir, se é possível, o mal. Visto que o proletariado e a miséria têm por causa orgânica a divisão da sociedade em duas classes: uma que trabalha e não possui; a outra que possui e não trabalha, que, por conseguinte, consome sem produzir; segue-se que o mal de que sofre a sociedade consiste nesta ficção singular de que o capital é, por ele mesmo, produtivo; enquanto o trabalho, por ele mesmo, não o é. Com efeito, para que as condições fossem iguais, nesta hipótese da separação do trabalho e do capital, seria preciso que, como o capitalista se desenvolve através de seu capital, sem trabalhar, também o trabalhador pudesse se desenvolver através de seu trabalho, sem capital. Ora, não é o que acontece. Portanto a igualdade, a liberdade, a fraternidade são impossíveis no regime atual; portanto a miséria e o proletariado são a conseqüência fatal da presente organização da propriedade.

Todo aquele que o sabe e não o confessa mente igualmente à burguesia e ao proletariado.

Todo aquele que solicita os sufrágios do povo e o dissimula não é nem socialista nem democrata.

Nós o repetimos:

A produtividade do capital, aquela que o cristianismo condenou sob o nome de usura, tal é a verdadeira causa da miséria, a verdadeira origem do proletariado, o eterno obstáculo ao estabelecimento da República. Nada de equívoco, nada de confusão, nada de subterfúgio! Que aqueles que se dizem democrata-socialistas assinem conosco esta profissão de fé; com este sinal, mas somente com este sinal, nós reconhecemos neles irmãos, verdadeiros amigos do povo, nós subscrevemos todos os seus atos.

E agora, o meio de extirpar o mal, de fazer cessar a usura, qual é? Será atacar o lucro francamente, apoderamo-nos da renda? Será, ao professar o maior respeito pela propriedade, roubá-la através do imposto, na medida em que ela é adquirida pelo trabalho e consagrada pela lei?

É aqui sobretudo que os verdadeiros amigos do povo se distinguem daqueles que não querem senão comandar o povo; é aqui se separam de seus pérfidos imitadores.

O meio de destruir a usura não é, mais uma vez, confiscar a usura; é opor princípio a princípio, isto é, numa palavra, organizar o crédito. Organizar o crédito, para o socialismo, não é emprestar a juros, visto que isto sempre seria conhecer a soberania do capital; é organizar a solidariedade dos trabalhadores entre eles, é criar sua garantia mútua, segundo este princípio de economia vulgar de que tudo que tem um valor de troca pode ser um objeto de troca, pode, por conseguinte, dar matéria a crédito.

Do mesmo modo que o banqueiro empresta seu dinheiro ao negociante que lhe paga isso em juros:
O proprietário fundiário empresta sua terra ao camponês que lhe para um arrendamento;
O proprietário de imóvel empresta um alojamento ao locatário que lhe paga isso em aluguel;
O comerciante empresta sua mercadoria à freguesia que compra à prestação;
Da mesma maneira o trabalhador empresta seu trabalho ao patrão que lhe paga no fim do mês ou no fim da semana. Todos quantos somos, nós emprestamos reciprocamente alguma coisa: não se diz vender a crédito, trabalhar a crédito, beber a crédito?

Portanto, o trabalho pode dar crédito dele mesmo, ele pode ser credor como o capital. Portanto, ainda, dois ou mais trabalhadores podem emprestar entre si seus produtos e, se eles se combinam por operações contínuas deste gênero, organizarão entre eles o crédito.

Eis o que compreenderam admiravelmente as associações operárias que, espontaneamente, sem comandita, sem capitais, se formam em paris e Lyon, e somente por isto elas se colocam em relação umas com as outras, elas se emprestam, organizam, como se diz, o trabalho. De modo que, organização do crédito, organização do trabalho, associação, é uma única e mesma coisa. Não é uma escola, não é um teórico que diz isto; é fato atual, o fato revolucionário que o demonstra.

Desta maneira, a aplicação de um princípio conduz o povo à descoberta de um outro, uma solução obtida conduz sempre a uma outra solução. Se portanto acontecesse que os trabalhadores se combinassem em todas as partes da República e se organizassem da mesma maneira, é evidente que, senhores do trabalho e produzindo incessantemente, pelo trabalho, novos capitais, logo teriam reconquistado, por sua organização e sua concorrência, o capital alienado; atrairiam a eles, principalmente, a pequena propriedade, o pequeno comércio e a pequena indústria; depois a grande propriedade e as grandes empresas; depois as explorações mais bastas, as minas, os canais, as estradas de ferro; eles se tornariam os senhores de tudo pela adesão sucessiva dos produtores e a liquidação das propriedades, sem espoliação nem saque dos proprietários.

(…) Tal é a obra começada espontaneamente sob nossos olhos pelo povo, obra que ele continua com energia admirável, através de todas as dificuldades da questão e das mais horríveis privações. E, não convém se cansar de dizê-lo, não são os fundadores da escola que começaram este movimento, não é o Estado que de o primeiro impulso, é o povo. Nós não somos aqui senão seus intérpretes. Nossa fé, a fé democrática e social, já não é mais uma utopia, é uma realidade. Não é de modo nenhum nossa doutrina que pregamos; são as ideias populares que tomamos por tema de nossos desenvolvimentos. Aquelas não são os nossos que desconhecem, que nos falam de associação e de República e que não ousam confessar para seus irmãos os verdadeiros socialistas, os verdadeiros republicanos.

Devotados há dez anos a esta ideia, nós não esperamos o triunfo do povo para nos alinharmos com ele.

(…) Que o governo, que a Assembléia Nacional, que a própria burguesia nos protejam e nos ajudem no cumprimento de nossa obra, seremos gratos por isso. Mas que não se procure mais distrair- nos daquilo que vemos como os verdadeiros interesses do povo; que não se tente nos iludir com inúteis aparências de reforma. Estamos bastante esclarecidos para sermos novamente ingênuos, sabemos melhor como vai o mundo do que os políticos que nos honram com suas advertências.

Nós estimaríamos muito que o Estado, através de contribuições tomadas sobre o orçamento, contribuísse para a emancipação dos trabalhadores; não veríamos senão com desconfiança o que se chama organização do crédito pelo Estado, e que não é, segundo nós, senão a ultima forma de exploração do homem pelo homem, nos rejeitamos o crédito do Estado porque o Estado, endividado em oito bilhões, não possui um centavo do qual possa dar crédito; porque sua procuração repousa somente sobre um papel de valor fixo; Porque o valor fixo leva fatalmente à depreciação e porque a depreciação sempre atinge o trabalhador de preferência ao proprietário; porque nós, produtores associados ou em via de associação, nós não temos necessidade nem do Estado nem de valor fixo para organizar nossas trocas; porque, enfim, o crédito pelo Estado é sempre o crédito pelo capital, não o credito pelo trabalho, sempre a monarquia, não a democracia.

No sistema que nos é proposto e que nós rejeitamos com toda a energia de nossas convicções, o Estado, para dar crédito, deve antes de tudo se prover de capitais. Estes capitais, é preciso que eles os exija à propriedade, pela via do imposto. É portanto voltar sempre ao principio, enquanto se trata de destruí-lo; é afastar a propriedade após tê-la proclamado, pela Constituição, inviolável.

Que outros, com ideias menos avançadas e menos suspeitas, de moral meticulosa, apoiem tais ideias, não acusaremos de modo algum sua tática.

Quanto a nós, que não fazemos de maneira alguma guerra aos ricos mas aos princípios; nós, que a contra-revolução não cessa de caluniar, nós devemos ser mais rigorosos. Nós somos socialistas, nós não somos espoliadores.

Não queremos imposto progressivo porque o imposto progressivo é a consagração do produto líquido, e nós queremos abolir, pela associação, o produto líquido; porque, se o imposto não retira ao rico a totalidade de sua renda, não é senão uma concessão feita ao proletariado, uma espécie de resgate do direito de usura, numa palavra, uma decepção, e porque, se retira toda a renda, é o confisco da propriedade, a expropriação sem indenização prévia e sem utilidade pública.

Que aqueles, portanto, que se dizem antes de tudo homens políticos invoquem o imposto progressivo como uma represália em relação à propriedade, como um castigo ao egoísmo burguês; nós respeitamos suas intenções e, se jamais lhes for dado aplicar seus princípios, deixaremos livre trânsito à justiça de Deus. Para nós, representantes daqueles que tudo perderam no regime do capital, o imposto progressivo, precisamente porque é uma restituição forçada, nos é interdito; nós jamais proporemos isso ao povo. Nós somos socialistas, homens de reconciliação e de progresso; nós não exigimos nem reação nem lei agrária.

Nós não queremos o imposto sobre as rendas do Estado porque este imposto é, como o imposto progressivo, em relação aos capitalistas, somente um confisco e, em relação ao povo, somente uma transação, um logro. Nós acreditamos que o Estado tem o direito de resgatar suas dívidas, por conseguinte, de emprestar a juros mais baixos; não pensamos que lhe seja permitido, sob pretexto de imposto, faltar a seus compromissos. Nós somos socialistas, nós não somos bancarroteiros. Nós não queremos o imposto sobre as heranças porque este imposto não é também senão uma retirada da propriedade, e que, sendo a propriedade um direito constitucional reconhecido por toda a gente, é preciso nela respeitar o voto da maioria; porque isto seria um ataque à família; porque não temos que produzir, para emancipar o proletariado, esta nova hipocrisia. A transmissão de bens, sob a lei da associação, não se aplicando de modo algum aos instrumentos de trabalho, não pode tornar-se uma causa de desigualdade. Deixai portanto a fortuna ir do proprietário morto ao seu parente mais distante, freqüentemente o mais pobre. Nós somos socialistas, nós não somos captores de heranças.

Nós não queremos o imposto sobre os objetos de luxo porque isto seria aniquilar as indústrias de luxo; porque os produtos de luxo são a própria expressão do progresso; porque, sob o império do trabalho e com a subordinação do capital, o luxo deve ser acessível a todos os cidadãos, sem exceção. Por que, após haver encorajado a propriedade, nós puniríamos de seu gozo os proprietários? Nós somos socialistas, nós não somos invejosos.

(…) Nós não queremos a expropriação pelo Estado das minas, canais e estradas de ferro: sempre é a monarquia, sempre o salariado. Nós queremos que as minas, os canais e as estradas de ferro sejam entregues às associações operárias, organizadas democraticamente, trabalhando sob a fiscalização do Estado, nas condições estabelecidas pelo Estado, e sob a sua própria responsabilidade. Nós queremos que estas associações sejam modelos propostos à agricultura, à industria e ao comercio, o primeiro núcleo desta vasta federação de companhias e sociedades, reunidas pelo laço comum da República democrática e social.

Nós não queremos tanto o governo do homem pelo homem como a exploração do homem pelo homem; aqueles que pegam tão depressa a fórmula socialista refletiram sobre isso? Nós queremos a economia nos gastos do Estado, assim como queremos a fusão completa, no trabalhador, dos direitos do homem e do cidadão, dos atributos do capital e do talento. É por isso que nós exigimos certas coisas que o socialismo indica, e que os homens que se pretendem mais especialmente políticos não compreendem. A política tende a especializar e multiplicar indefinidamente os empregos; o socialismo tende a fundi-los uns nos outros.

Assim, nós acreditamos que a quase totalidade de obras públicas pode e deve ser executada pelo exército; que esta participação nas obras públicas é o primeiro tributo que a juventude republicana deve pagar à pátria; que em conseqüência o orçamento da guerra e o das obras públicas é um gasto inútil. É uma economia de mais de cem milhões; a política não se preocupa com isso.

Fala-se de ensino profissional. Nós acreditamos que a escola da agricultura é a agricultura; a escola das artes, profissões e manufaturas é a oficina; a escola da navegação é o navio; a escola da administração é a administração etc.

O aprendiz é tão necessário ao trabalho quanto o operário: por que colocá-lo à parte numa escola? Nós queremos a mesma educação para todos: de que servem estas escolas que, para o povo, não são senão escolas de aristocratas e para nossas finanças um gasto inútil? Organizai a associação e, imediatamente, toda oficina tornando-se escola, todo trabalhador é mestre, todo estudante aprendiz. Homens de elite se produzem tão bem ou melhor na obra como na sala de estudo.

A mesma coisa no governo.

Não é suficiente dizer que se é contra a presidência se não se abolem os ministérios, eterno objeto de ambição política. Cadê á Assembléia Nacional exercer, pela organização de seus comitês, o poder executivo, como ela exerce por suas deliberações em comum e seus votos o poder legislativo.

Os ministros, subsecretários de Estado, chefes de divisão etc., são uma repetição inútil dos representantes, cuja vida desocupada, dissipada, entregue à intriga e á ambição, é uma causa incessante de embaraço para a administração, de más leis para a sociedade, de despesas estéreis para o Estado.

Que nossos jovens sócios o metam na cabeça: o socialismo é o contrário do governamentalismo. Isto é tão velho para nós quanto o preceito: Entre senhor e escravo nada de sociedade.

Nós queremos, ao lado do sufrágio universal, e como conseqüência deste sufrágio, a aplicação do mandado imperativo. Os políticos se revoltam com isso! O que quer dizer que a seus olhos o povo, elegendo representantes, não se dá de modo algum mandatários, ele aliena sua soberania! Com certeza isto não é socialismo, isto não é nem mesmo a democracia.

Nós queremos a liberdade ilimitada do homem e do cidadão, salvo o respeito à liberdade do outro:
Liberdade de associação;
Liberdade de reunião;
Liberdade de culto;
Liberdade de imprensa;
Liberdade de pensamento e de palavra;
Liberdade de trabalho, de comércio e de indústria;
Liberdade de ensino;
Numa palavra, liberdade absoluta.

Ora, entre estas liberdades há sempre alguma que a velha política não admite, o que acarreta a ruína de todas! Nos dirão um momento: mas quer-se a liberdade com exceção ou sem exceção?

Nós queremos a família: onde estão aqueles que a respeitam mais que nós? Mas nós não tomamos a família como modelo da sociedade. Os defensores da monarquia nos ensinaram que era à imagem da família que as monarquia eram constituídas. A família é o elemento patriarcal ou dinástico, o rudimento da realeza; o modelo da sociedade civil é a sociedade fraternal.

Nós queremos a propriedade, mas colocada em seus justos limites, quer dizer, à livre disposição dos frutos de trabalho, a propriedade menos a usura! Nós não temos necessidade de dizer isso mais. Aqueles que nos conhecem nos entendem.

Tal é, em substância, nossa profissão de fé. Era importante, sem dúvida, saber, de um lado, se o povo devia se abater ou votar; em segundo lugar, sob que bandeira se faria a eleição, sob que profissão de fé.

(…) O comitê eleitoral central decidiu, por unanimidade, apresentar como candidato o cidadão Raspail.

Raspail, o eleito de 66 mil votos parisienses e 25 mil lyoneses;

Raspail, o implacável denunciador das mistificações políticas;

Raspail, cujos trabalhos na arte de curar o colocaram ao lado dos benfeitores da humanidade.

Aderindo a esta candidatura, não tencionamos de modo algum, como escreveu em algum lugar o honorável Senhor Ledur Rollin, dar eventualmente à República um chefe; longe disso, nós admitimos Raspail como protesto vivo contra o principio da Presidência! Nós o apresentamos ao sufrágio do povo não porque ele é ou se crê possível, mas porque ele é impossível: porque com ele a Presidência, imagem da realeza, será impossível.

Nós não mais tencionamos, ao convocar os votos para Raspail, lançar à burguesia, que teme este grande cidadão, um desafio. O que nós buscamos antes de tudo é a reconciliação, a paz.

Nós somos socialistas, nós não somos desordeiros.

Nós apoiamos a candidatura de Raspail a fim de exprimir mas fortemente aos olhos do país esta ideia de que, de hoje em diante, sob a bandeira da república, não há mais senão dois partidos na França, o partido do trabalho e o partido do capital.

 

Retirado de Journal du Peuple, 8-15 de novembro de 1848.